quinta-feira, 25 de abril de 2013

quarta-feira, 24 de abril de 2013

O desenvolvimento da consciência ecológica na educação infantil

Adriela Balotin
Meridiana Bernardi

Resumo: A consciência ecológica deve estar a cada dia mais presente na realidade escolar, pois se sabe da necessidade crescente de preservar o meio ambiente para a vida atual e futura. Pensando nisso, a Escola Municipal de Educação Infantil Tio Luiz MARAU-RS criou e vem desenvolvendo um projeto ambiental que oportuniza as crianças a construção de brinquedos com materiais recicláveis, elementos até então descartados por suas famílias. Seguindo a idéia de preservação, criou e implantou uma horta onde os pequenos tem a possibilidade de manter contato com a terra e ainda, a seu modo, terão que manter o bom funcionamento da mesma. Atividades essenciais para a construção de um olhar sensível à natureza, desde a sua atual idade, ou seja, 3 e 4 anos.
Palavras chave: Consciência ecológica, horta, reciclagem, criança.
Este artigo pretende mostrar o desenvolvimento do projeto sobre cidadania e consciência ecológica que esta sendo desenvolvido durante o ano letivo de 2011, com 43 crianças, na faixa etária entre três e cinco anos, alunos do Jardim I e II da EMEI Tio Luiz, escola pública no município de Marau - RS. Pela relevância dos comentários, serão inseridas falas e entrevistas de pais e alunos. Por ética e respeito ao anonimato, os participantes serão nominados pelas letras: A, B, C.
O projeto leva em consideração a triste situação a qual se encontra o nosso planeta, onde a cada dia nos mostra a urgência de mudanças drásticas pelos seres humanos, a exemplo da devastação das florestas que continuam sendo cortadas, sendo que a tendência é o aumento do número de desastres naturais, muito maiores dos que já estão ocorrendo. Acreditamos que se trabalharmos com as crianças pequenas tentando conscientizá-las sobre a importância da preservação ambiental, esta será uma atitude levada para a vida futura, pois é de conhecimento que é na primeira infância que se estabelece o desenvolvimento das aprendizagens.
Cabe a escola o papel de mostrar as formas de preservar o meio ambiente e assim impedir a destruição da própria espécie futuramente. Ajudando as crianças a mudar de atitude e assim transformando-se em cidadãos conscientes na defesa do planeta. O professor trabalhando com consciência em sala de aula acaba por envolver toda a comunidade escolar fazendo uma reflexão em conjunto sobre a importância de preservar o planeta tanto agora quanto a longo prazo. A Antropóloga Lucila Pinsard reforça: “As escolas são espaços privilegiados de formação e a Educação Ambiental é a forma de interagir com a comunidade e operar mudanças na sociedade”. (Nova Escola, 2007, p. 48)
De nada adianta o conhecimento do professor em grandes temas ambientais como aquecimento global, destruição das matas, se ele não for capaz de ensinar aos pequenos a separar o lixo, reaproveitar materiais que seriam descartados e a trabalhar as relações humanas e as conseqüências de nossas ações sobre o meio.
A população de um modo geral mostra preocupação com a devastação ambiental, mas muitas vezes parece que muito se fala e pouco se faz na eficiência de atitudes de preservar o planeta. PAI D comenta: “Atos simples que no futuro representarão muito. Qualquer medida cabível é tomada, porém às vezes sentimos que fazemos tão pouco perante a um fato tão importante e preocupante quanto é a preservação ambiental.” Paulo Freire, reforça o pensamento:
Por que não aproveitar a experiência que tem os alunos de viver em áreas da cidade descuidadas pelo poder público para discutir, por exemplo, a poluição dos riachos e dos córregos e os baixos níveis de bem-estar das populações, os lixões e os riscos que oferecem à saúde das gentes (FREIRE, 1996, p. 30).
As pessoas não podem fugir de sua responsabilidade nas áreas de seu interesse pessoal, quanto mais no campo da natureza, onde o interesse deve ser global. O Planeta pertence a todos, logo todos devem e precisam lutar pela sua defesa, para promover condições habitáveis. O crescimento acelerado das metrópoles e do consumo de produtos industrializados e descartáveis transformou a produção de lixo em um dos maiores problemas da sociedade moderna. O volume de lixo tem crescido em quantidades assustadoras, gerando escassez de áreas para o seu destino final. Além disso, a sujeira despejada no ambiente aumentou a poluição do solo, das águas e do ar, prejudicando as condições de saúde da população mundial.
Na busca pelo desenvolvimento sustentável, percebe-se que poucas ações efetivas foram realizadas. Na realidade precisa-se com urgência reavaliar profundamente os valores e as condutas da sociedade atual a fim de alterar o processo de degradação ambiental do Planeta Terra.
Se todas as pessoas são responsáveis, é ao professor, a quem cabe a formação das futuras gerações. Sendo a educação considerada um processo amplo e global, cabe ao educador participar da vida social, servindo de exemplo aos alunos. Aspecto importante dessa participação sendo o seu primeiro objetivo é a proposta da defesa da natureza e a preservação do equilíbrio ecológico. Os parâmetros curriculares nacionais vêm ao encontro dessa idéia afirmando que:
[...] a principal função do trabalho com Meio Ambiente é contribuir para a formação de cidadãos conscientes, aptos para decidirem e atuarem na realidade socioambiental de um modo comprometido com a vida, com o bem-estar de cada um e da sociedade, local e regional. Para tanto, é necessário que a escola trabalhe atitudes, com formação de valores aliadas ao ensino e à aprendizagem de habilidades e procedimentos, tornando-se esse o grande desafio para a educação. (BRASIL, 1997, vol. 9, p. 29).
No que tange a temáticas ligadas ao meio ambiente, um dos assuntos que mais se salienta é a problemática do lixo, tanto no Brasil como no exterior. Na atualidade, verifica-se que as cidades não possuem infra-estrutura para acompanhar o crescimento populacional, gerando falta de destino adequado ao lixo produzido pela população. Toma-se, por exemplo, que na metade do século passado a composição do lixo era predominantemente de matéria orgânica, de restos de comida. Entretanto, com o avanço da tecnologia, materiais como plásticos, isopores, pilhas, baterias de celulares e lâmpadas tornaram-se presença constante na coleta domiciliar. Logo, dar um destino adequado tornou-se um dos grandes desafios da administração pública em todo o Planeta.
De acordo com os meios de comunicação, no Brasil, boa parte do lixo é simplesmente jogada em grandes terrenos, porém ainda têm locais que nem coleta há. Aliada a esse contexto, verifica-se que a tecnologia evolui rapidamente gerando conseqüências indesejáveis no ambiente da natureza. Além disso, se passa a constatar uma deterioração na qualidade de vida afetando a saúde, tanto física quanto psicológica das pessoas.
Nas palavras de Ruscheinsky e Costa (2002, p. 84) “A sociedade de consumo da atualidade endossa princípios que levam à degradação dos bens naturais.” Dessa forma, a educação ambiental deve ser praticada coletivamente: “deve se dar na intersubjetividade e na intercomunicação dos sujeitos que estão desvelando a realidade e construindo a compreensão de fenômenos dos elementos que compõem o mundo.”.
Por reciclagem entende-se como um conjunto de técnicas as quais objetivam aproveitar os detritos e reutilizá-los no ciclo de produção de que saíram. Resultam de uma série de atividades em que materiais se tornariam lixo ou já estão no lixo, porém são desviados, coletados, separados, processados para serem usados como matéria-prima na manufatura de novos produtos.
Dessa forma, a reciclagem é uma importante parceira do desenvolvimento sustentável, uma vez que está vinculada a aspectos técnicos, econômicos e sociais da relação entre o homem e o meio ambiente. Uma das formas de promover a reciclagem é através da educação. Salienta-se ainda que esse processo demanda tempo e perseverança, logo é imprescindível que seja ensinado e estimulado ainda no início da vida de cada criança.
Criando e recriando a partir do meio
Na visão de Oliveira (1984, p.....), “as mãos humanas são capazes de exprimir o que máquina alguma poderia fazer, ou seja, nossa própria identidade, ou seja, nossa própria identidade”.
A sucata é a oportunidade que a criança tem de construir o seu próprio brinquedo, no momento em que isso acontece também é possível explorar relações de cor, seriação, quantidade. Porém para que isso se de forma natural o professor deve se mostrar liberto de idéias pré-concebidas deixando que os alunos ao seu tempo possam mostrar sua criatividade.
Além disso, o brinquedo artesanal proporciona momentos de ludicidade para quem o cria. Assim, esses brinquedos sempre terão espaços imprescindíveis na formação social das crianças.
Dessa forma, a sucata é um suporte potencial para qualquer atividade na educação infantil, entretanto se deve observar alguns cuidados básicos. Não é com todo material descartável que o aluno pode brincar. Também é necessário que esse material esteja limpo, organizado e não ofereça perigo. É imprescindível diferenciar sucata de lixo. (SANTOS, 2002, p. 07).
Para a construção de jogos e brinquedos com material de sucata o essencial não é o objeto em si, mas o que ele pode oferecer. O principal é o que um objeto de sucata pode contribuir no contexto no jogo. Torna-se importante a construção de uma “sucatoteca”, ou seja, um conjunto de materiais descartáveis que pressupõe limpeza, seleção e análise da matéria-prima, tanto de forma qualitativa, quanto quantitativa. Além disso, são necessários na visão de Santos (2002), para a produção artesanal materiais e acessórios de boa qualidade, como tesouras, colas, etc. e ainda espaços adequados.
Pais conscientes da importância do projeto da EMEI TIO Luiz a qual valoriza a consciência ambiental, foram incentivados a participarem do projeto enviando de materiais que em suas casas seria descartado no lixo. E para nossa alegria como em outras ocasiões que foram solicitados responderam ao chamado, como revela o Pai B: “É muito importante aprender a preservar o meio ambiente, pois se desde pequena ela aprende a preservar e ter a consciência de que é importante e necessário para ela e, as pessoas que a cercam e, para os que virão futuramente, assim ela cuidará do meio ambiente.”.
Em sala de aula foi possível desenvolver o projeto de forma efetiva e também perceber e valorizar a participação das famílias. Como primeiro passo as crianças tiveram acesso às sucatas manuseando-as e classificando-as, fizeram o contato com o material que iriam usar na construção dos elementos, originados de sua imaginação. Importante ressaltar o quanto os brinquedos ficaram bonitos, isto possível pela criatividade de cada sujeito, por vezes inimagináveis a olhos adultos. As meninas optaram pela montagem de bonecas, sofás, mesas, TVs e até vasos para plantar flores. Já os meninos com seu instinto masculino optaram por carros, trens, robôs e armas.
Ao percebermos os objetos construídos foi possível perceber a interdisciplinaridade entre meio ambiente/afetividade assim como a relação individuo/planeta. O pai A nos mostra a sua preocupação quando fala: “É muito importante, pois desde pequeno o ser humano deve saber como cuidar do ambiente em que vive”.
Após a construção dos brinquedos e jogos, foi realizada uma feira de sucatas, expondo para a escola toda os brinquedos construídos pelas crianças, valorizando assim o empenho de cada um, onde cada trabalho recebeu muitos incentivos a sua continuidade. Visto que a criança aprende através do exemplo e pelo estimulo e, todo aprendizado jamais será esquecido apenas aprimorado.
A importância do contato com a terra
Durante o ano de 2008, a EMEI Tio Luiz passou por uma reestruturação no seu espaço físico ampliando o número de salas de aula, resultando na supressão da área verde e no espaço para brincadeiras ao ar livre, onde havia árvores e um parque aberto contendo areia e brita. No momento a área externa esta reduzida a um parque coberto com piso de cimento e um pequeno espaço com britas, este último pouco utilizado pelas crianças.
Crianças da atualidade, por habitarem em apartamentos, tem pouco contato com as plantas, e aquelas que decoram suas casas, normalmente são para serem apreciadas, quase nunca manuseadas. O pai C revela seu pensamento: “É muito importante uma casa ter um pátio para uma criança ser livre”. Percebendo a ausência deste contato, incentivamos os alunos a colocarem a mão na terra, onde a primeira experiência aconteceu no ano de 2010, ao plantarem sementes de flores em garrafas pet, percebendo ainda o reaproveitamento de um material descartável. Esta experiência sensibilizou as crianças, e uma prova foi o presente que um menino quis oferecer a sua professora, no dia dos professores, pois ao ouvir a indicação da mãe em comprar uma flor para a sua profe, ele ressaltou: “minha profe me ensinou a plantar, então que eu planto o presente dela”. (Aluno A)
A descoberta em dar vida a uma semente e dela surgir uma planta entusiasmou os pequenos, e dessa atitude surgiu à idéia de se criar uma horta, no espaço onde até então havia brita. Essencial é a crença de que não é apenas largar uma semente na terra e acompanhar o seu desenvolvimento e sim o “plantar juntos” a consciência ecológica. Ruscheinsky e Costa reforçam a importância deste pensamento:
[...] o processo de educação, voltado para um relacionamento diferenciado com o meio ambiente, requer a apropriação da realidade por meio da ação-reflexão. O movimento dialético da práxis, como basilar da educação ambiental, encaminhará homens e mulheres ao reconhecimento do seu meio, à assunção como produtores de um alimento nobre e à autonomia de decisão [...]. (2002, p.73)
A partir disso muitas conversas aconteceram com os pequenos, enfatizando a importância das plantas, do consumo de alimentos saudáveis, do contato com a terra, para somente depois começarmos a construção da horta. Professoras e alunos participaram voluntariamente da construção da horta, que iniciou com a retirada de britas em mutirão, munidos de baldes e pás de kits praia, onde essa atividade se transformou numa grande brincadeira, pois naquela manhã enquanto alguns alunos usavam o parque, outros enchiam seus baldes, cantavam suas músicas preferidas, comprovação da satisfação do seu “trabalho”. Na seqüência foi preciso carregar a terra que estava fora do pátio escolar até os canteiros, com nova jornada de trabalho e as mesmas ferramentas. O aluno B nos mostra o quanto essa atividade foi importante no seu desenvolvimento dizendo: “Eu queria que tivesse brita e terra assim onde eu moro pra brinca de baldinho”.
Após esse processo organizacional começou o plantio propriamente dito. Inicialmente com a semeadura de salsa, doada por uma das serventes da escola e, de cenoura doação de um aluno do turno da manhã. Também houve o plantio de mudas de alface, doadas por uma aluna do turno da tarde. Essas doações mostram o envolvimento das famílias em ajudar o projeto a acontecer, pois além do apoio, mandaram para a escola os materiais necessários. O aluno C nos expõe a sua alegria com o plantio: “Profe que legal, é aqui que nós vamos plantar alface. E ela vai crescer?”.
Considerações finais
Feliz da criança que ainda pode manusear a terra, pois sabemos o quanto este contato pode vir a acrescentar na vida futura destes pequenos cidadãos. Sabemos que na educação nenhum resultado é imediato, mas que tudo o que for incentivado na primeira infância ajudará na formação de cidadãos conscientes de seu papel na sociedade, sabendo tomar decisões sem a necessidade constante de intervenções, visto que o meio ambiente faz parte da vida de qualquer ser humano.
O professor é considerado o detentor do saber do qual a criança ainda não domina, pois carrega esta experiência e assim consegue transmitir a mensagem de preservação e respeito à vida. Acreditamos que este conhecimento não será esquecido, e sim relembrado, nas diversas etapas da vida, especialmente quando forem adultos conscientes. Lembrarão com carinho da escola que os orientou a não prejudicar o planeta.
A seriedade embasou este projeto e este foi fundamental para a obtenção dos resultados satisfatórios, especialmente por percebermos a boa recepção junto às famílias e a comunidade escolar, parceira na realização das atividades, sempre que solicitados. Atitudes que vieram a somar na relação família-escola, onde ambas devem estar unidas para o pleno desenvolvimento infantil.
Sendo que todo processo educativo ambiental na Educação Infantil esta sendo realizado com sucesso, pois as crianças e os próprios docentes envolvidos na causa, até então enriquecem seus conhecimentos contagiando todos que estão a sua volta. Na subjetividade de cada um essas percepções se constituem fazendo a interação dialógica com o mundo e transformando em ação.
Práticas como esta auxiliam na mudança de pensamento quando ainda se diz que “criança vai para a creche apenas para ser cuidada”, pois os pais tomam conhecimento da riqueza de muitas práticas, e vêem que nas EMEIS, especialmente de Marau, os profissionais que desenvolvem estes projetos, são pessoas capacitadas e preocupadas com o desempenho escolar num todo, especialmente aqueles que apontam à preservação de valores ao longo da vida.
As atividades seguem até o final do ano letivo, porém não findará com ele, pois é projeto norteador das ações da escola. A cada dia novas lições estão sempre aprendidas, atitudes analisadas e novas posturas reorganizadas para a sua continuidade, primando por sua constante melhoria. Comprovando este olhar e acreditando na ampliação do espaço físico para a horta que hoje é de dois canteiros de 150 centímetros 0,75 centímetros cada um, o próximo passo será convidar os pais para retirarem o restante das britas e esta horta poder contar com mais de dois canteiros. Ampliando espaços, acreditamos que estaremos ampliando idéias.
Para nós educadoras é um desafio formar sujeitos ecológicos através de projetos duradouros, e desse modo desacomodando toda a comunidade escolar. Quando isso ocorre alunos e professores fortalecem o vinculo afetivo e passam a juntos cuidar do ambiente escolar e a se interessar pelo que acontece fora dele envolvendo as famílias e deste modo passamos a fazer diferença na vida de cada criança.
Embora saibamos que para o planeta nossa atitude possa parecer pequena, para as crianças que tem uma vida pela frente, esta “pequena semente” ambiental é de grande valia.

REFERÊNCIAS
BRASIL. Parâmetros curriculares nacionais: meio ambiente e saúde. Vol. 7. Brasília: MEC, 1997.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. 28 ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
OLIVEIRA, Paulo de Salles. O que é brinquedo. São Paulo: Brasiliense, 1984.